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45 Minutos

Numa manhã de sol e vento, o Schimidt recebeu um e-mail com o seguinte texto:
"Quero te ver. Daiane."
Só. O Schimidt ficou pensando. Daiane? Não conhecia nenhuma Daiane. E, olha, o Schimidt conhecia manadas de mulheres. Era chamado de Schimitão Gostosão. Tinha um feitiço, algo assim. Não que fosse um Brad Pitt ou um Sean Connery ou um Wianey Carlet, nada disso.
Era um homem... normal. Tinha lá uma barriguinha normal, um sorriso normal, uns olhos normalmente míopes. Era normal. Mas quando o Schimitão FALAVA com elas... Rá! Nenhuma mulher resistia a 45 minutos de conversa a sós com o Schimitão.
— Um tempo de jogo — ele dizia sempre. — É só do que preciso.
E não apenas no amor. Schimitão era centroavante artilheiro, mas nunca, em jogo algum, marcou gol no primeiro tempo.
— É que preciso de 45 minutos para amolecer o zagueiro — explicava.
De fato, o primeiro tempo inteiro ele passava falando com o seu marcador, cochichando ao ouvido do zagueiro. Os colegas de time observavam as reações do adversário. Alguns esbravejavam, outros tentavam agredi-lo, mas todos, invariavelmente, acabavam entregando pelo menos uma bola no segundo tempo. E aí o Schimitão não perdoava — marcava.
O mesmo com as mulheres. As melhores, as mais belas, as mais cobiçadas, as mulheres de minissaia e botas, enfim, haviam tido casos com o Schimitão depois de passarem por uma sessão de 45 minutos de charla. Os amigos se intrigavam: o que será que ele fala para elas? O que será que ele fala para os zagueiros?
O Schimitão, claro, não contava.
Um dia, porém, o Schimitão resolveu encerrar a carreira. De conquistador e de centroavante. Por causa da Cris. Linda, meiga, carinhosa, Cris, segundo o Schimitão, era quase perfeita.
— Ela até cozinha bem! — se admirava. — Nunca vou achar outra igual.
Os únicos defeitos dela eram uma certa dose exagerada de ciúme e o ódio que devotava ao futebol. Detestava, sobretudo, os jogos do Schimitão no fim de semana. Assim, o Schimitão abandonou o time. Pendurou as chuteiras.
— Vale a pena o sacrifício para ficar com a Cris — explicava.
E abandonou também a vida noturna, suas inúmeras mulheres, as farras com os amigos. Uma mudança espantosa. Mas Cris conhecia sobejamente a fama dele e passava os dias temendo que, afinal, descobrisse estar sendo traída. Quando alguém lembrava do passado suntuoso do Schimitão, ela estremecia. Será que ele mudou mesmo? Não é possível! Cachorro comedor de ovelha...
Então ela decidiu testá-lo. E inventou o e-mail: "Quero te ver. Daiane". Se ele caísse na cilada, estava provado: jamais deixaria de ser um maldito mulherengo, um desprezível polígamo! Durante dias, Cris esperou, ansiosa, pela resposta. Mas o Schimitão, cauteloso, sabia que provas escritas são irrefutáveis. Pensou, pensou, pensou a respeito, até, finalmente, escrever de volta.
Ao ver o e-mail dele piscando no seu terminal, Cris estemeceu. Desgraçado! Aí estava a prova! Mas, ao abrir a mensagem, viu que o texto era conciso e prudente: "Quem tu és?" Nada mais. Cris percebeu que ele estava desconfiado. Decidiu dar-lhe mais corda. Respondeu: "Quer que te ligue? Qual o teu telefone?"
Não foi desta feita, no entanto, que o Schimitão caiu na armadilha. No dia seguinte, enviou um mail para ela: "Vamos fazer o seguinte: TU me dás o teu telefone".
Cris ficou nervosa. Schimidt estava prestes a traí-la. Com ela mesma! Tinha de levar a farsa adiante. Mas como faria com aquilo do telefone? Teria de arranjar um número que ele não reconhecesse... Poderia até sofisticar a história, fazendo com que ele marcasse algo com uma mulher... uma mulher... A Mirna! Claro! Schimidt e Mirna não se conheciam. Pediria a Mirna que assumisse a personalidade da Daiane e combinasse um encontro com ele. Ele aceitaria, era evidente, e seria desmascarado! Traidor! Cachorrro!
Foi o que a Cris fez. Explicou a situação a sua amiga Mirna, e a Mirna, rindo muito só de imaginar a travessura, disse que ia adorar montar a emboscada para o Schimitão. No e-mail seguinte, portanto, Cris-Daiane deu ao Schimitão o número do telefone da Mirna.
— Quando ele ligar, marca um encontro com ele — instruiu-a Cris. — Depois, eu vou no teu lugar. Ele vai ver só! Traidor!
De fato, o Schimitão ligou. Falou com a Mirna. Conversaram durante longo tempo. Pouco mais de 45 minutos.
Hoje, eles estão casados e felizes. Schimitão descobriu que Mirna era tão bela, tão meiga e tão carinhosa quanto a Cris. E mais: ela gosta de futebol e insistiu para que ele voltasse a jogar. Hoje, o Schimitão continua seduzindo os zagueiros e marcando gols no segundo tempo.
Ao voltar para casa, encontra a bela Mirna, a afável Mirna, a dócil Mirna, que, além de tudo, é melhor cozinheira do que a velha e esquecida Cris. Uma mulher quase perfeita. Seu único defeito é não permitir que o Schimitão converse com qualquer mulher por mais de 40 minutos. Mais de um tempo de jogo, jamais!
Porque a Mirna sabe melhor do que ninguém: se deixar o Schimitão falar, é gol.

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